A má nutrição é um cenário que afeta a população mundial adulta e infantil, podendo levar a impactos nutricionais e condições indesejadas, tais como a desnutrição, deficiências nutricionais, sobrepeso e obesidade1,2.
A prevalência da obesidade infantil tem aumentado de forma expressiva nas últimas décadas e representa um grande problema de saúde pública no mundo1,2. Essa é uma condição multifatorial, resultado da combinação de fatores que incluem, além da má nutrição, questões genéticas, comportamentais e ambientais2.
Por ser multifatorial, a elaboração de estratégias de intervenção e tratamento exige uma compreensão integrada dos agentes causadores e de sua ligação com contextos familiares, escolares e sociais da criança2.
Panorama da obesidade infantil no Brasil e no mundo
Globalmente, dados recentes publicados pela Federação Mundial de Obesidade estimam que, até o ano de 2035, duas a cada cinco crianças no mundo com idade de 5 a 19 anos apresentarão sobrepeso e obesidade, de acordo com a classificação do Índice de Massa Corporal (IMC)3.
Em âmbito nacional, em 2020, 15,9% dos menores que 5 anos, 31,8% das crianças entre 5 e 9 anos e 31,9% dos adolescentes apresentavam IMC elevado2. A previsão para 2035 é que a prevalência de crianças e adolescentes brasileiros com sobrepeso e obesidade aumente para 50%3.
A instalação precoce da obesidade leva ao maior risco do desenvolvimento de doenças crônicas não transmissíveis (DCNTs) ainda na infância, aumentando o risco de consequências para a saúde também na vida adulta3.
Além de ser forte preditora para DCNTs, a obesidade infantil também pode levar a impactos negativos na vida social da criança, tais como bullying, o desenvolvimento de baixa autoestima e de sintomas depressivos4.
A prevenção começa no início da vida
As ações para prevenção da obesidade infantil devem iniciar ainda no período da gestação, uma vez que a saúde materna pode influenciar diretamente na saúde do bebê e no risco de obesidade2. Após esse período, a promoção do aleitamento materno e o acompanhamento nutricional do bebê ao longo da introdução alimentar e dos primeiros anos de vida também terão impacto significativo na prevenção da obesidade infantil.
- Gestação
O ganho de peso excessivo e a má nutrição da gestante são os principais fatores que podem contribuir para o desenvolvimento da obesidade infantil2. Assim, o acompanhamento nutricional da gestante com objetivo de garantir um ganho de peso adequado, além de bom aporte nutricional ao longo da gestação, é de grande relevância. A educação nutricional para este público pode auxiliar no estabelecimento de hábitos saudáveis para toda a família até mesmo após a gestação, o que é extremamente benéfico para a saúde do bebê que irá chegar.
- Aleitamento materno
O aleitamento materno, além de fornecer todos os nutrientes importantes para o crescimento e desenvolvimento ideais do bebê, também está diretamente relacionado à prevenção do excesso de peso4,5. Por isso, é fundamental sempre reforçar a indicação do aleitamento materno exclusivo até os 6 meses e complementar até 2 anos de vida ou mais2,4.
- Introdução alimentar
A introdução alimentar deve ser iniciada a partir dos 6 meses de vida e tem de grande relevância do contexto de prevenção da obesidade. Uma orientação adequada, de acordo com as recomendações atuais, previne que os bebês sejam expostos precocemente a alimentos ricos em açúcar/gorduras5,6.
A partir de 1 ano de vida, as crianças devem receber as mesmas refeições da família e manter o padrão de alimentação saudável com limitação de alimentos ricos em açúcar, sal e gorduras saturadas/trans, e que possuem alta densidade energética e baixo aporte de vitaminas, minerais e fibras4,6.
Além dos pontos mencionados acima, é válido incentivar outras medidas comportamentais de prevenção da obesidade infantil, como a prática de atividades físicas e redução do tempo de tela, combatendo o sedentarismo4.
Tratamento nutricional
Para o tratamento da obesidade infantil, devem ser realizadas intervenções comportamentais com objetivo de encorajar a alimentação saudável e a redução do sedentarismo2,4.
Do ponto de vista nutricional, o tratamento recomendado é baseado em orientações qualitativas. O incentivo ao reconhecimento da autorregulação de fome e saciedade é um ponto importante, assim como o envolvimento de toda a família no preparo dos alimentos e no momento das refeições4.
Na prática clínica, algumas condutas nutricionais podem ser realizadas, entre elas4:
- Fazer desjejum todos os dias, uma vez que o hábito de pular o café da manhã está relacionado ao aumento do IMC em crianças e adolescentes;
- Substituir o leite integral pela versão semidesnatada, a partir dos 2 anos de vida;
- Evitar a oferta de bebidas artificiais e/ou adicionadas de açúcares e aromatizantes;
- Oferecer frutas e legumes com casca e incentivar o consumo de leguminosas e cereais integrais, para aumentar o aporte de fibras;
- Incentivar uso de garrafinha de água na escola, para otimizar hidratação;
- Preferir frutas, ao invés de sucos;
- Evitar consumo de fast food e refeições fora de casa;
- Realizar refeições em família, sempre que possível.
Orientações focadas em mudança de estilo de vida são as mais indicadas para o tratamento da obesidade infantil, uma vez que o fator principal para o aumento da obesidade é o fator ambiental, que promove a escolha de alimentos não saudáveis e comportamentos sedentários2. Não são recomendadas dietas restritivas, que estas podem afetar o crescimento e desenvolvimento das crianças, além de não promoverem hábitos saudáveis sustentáveis4. Assim, devemos sempre priorizar intervenções na rotina que sejam feitas de modo gentil, respeitando a criança e envolvendo toda a família para uma mudança comportamental eficiente e duradoura.