
Por Acervo Piracanjuba
26 de maio, 2025
Suplementação de ferro: quais as diferenças entre os principais formatos do mineral
A suplementação de ferro é essencial para o tratamento da anemia ferropriva. Escolher a melhor forma de suplemento é a chave para o sucesso e adesão do paciente.


A anemia por deficiência de ferro, ou anemia ferropriva, é a anemia mais comum em todas as faixas etárias, acometendo principalmente as crianças, mulheres em idade fértil e gestantes1.
No Brasil, é considerada um grave problema de saúde pública. Neste contexto, a suplementação de ferro é necessária para o tratamento da anemia ferropriva e as formas de suplementação podem variar de acordo com o perfil de cada paciente.
O impacto da anemia ferropriva na saúde
A anemia por deficiência de ferro causa impactos negativos em diferentes fases da vida1:
Na gestação, as principais complicações associadas à deficiência de ferro são: trabalho de parto prematuro, pré-eclâmpsia, aborto espontâneo, disfunção cognitiva, redução do desempenho físico, instabilidade emocional, depressão no puerpério e insuficiência cardíaca. No feto, podem ocorrer repercussões graves, como o retardo de crescimento ou óbito intrauterino, além de baixo peso ao nascer1.
Nas crianças, podem ocorrer infecções frequentes, irritabilidade, apatia, anorexia, falta de atenção, dificuldade de aprendizagem e baixo rendimento cognitivo por atraso do desenvolvimento neurológico e psicomotor1.
Nos adultos, a presença de anemia ferropriva é fator de risco isolado para outras comorbidades. Sintomas como cansaço, cefaleia, irritabilidade, lentidão de raciocínio, dificuldade de concentração, sonolência, tontura, queda de cabelo, unhas fracas e quebradiças, menor rendimento laboral e menor desempenho esportivo também podem estar presentes1.
Nos idosos, a presença de anemia pode causar mais hospitalização, declínio cognitivo, quedas e fraturas1.
A importância da suplementação
Tendo em vista todos os impactos da anemia por deficiência de ferro na saúde, é recomendada a suplementação terapêutica para correção da situação.
O tratamento deve ser feito com formulações de ferro preferencialmente por via oral, conforme preconizado pelo Programa Nacional de Suplementação de Ferro e pela Organização Mundial da Saúde2,3.
A escolha do formato de preparação do ferro vai depender, principalmente, da gravidade do quadro, tolerância e condições financeiras de cada paciente.
O benefício real de um suplemento de ferro depende de alguns fatores, tais como a efetividade terapêutica, a tolerância gastrointestinal, o número de administrações diárias e a incidência de eventos adversos1.
Tipos de suplementos
Os principais suplementos de ferro disponíveis e comercializados são os sais de ferro, ferro quelado e complexo de ferro polimaltosado (ferripolimaltose).
Entenda a seguir quais são as características de cada um para a utilização na prática clínica.
- Sal ferroso
Os sais ferrosos mais comuns são: sulfato ferroso, fumarato ferroso e gluconato ferroso4.
O sulfato ferroso, fumarato ferroso e gluconato ferroso contêm 20%, 33% e 12% de ferro elementar, respectivamente1. Além disso, possuem menor custo quando comparados a outras formas de ferro, porém, apresentam maiores taxas de efeitos adversos durante o tratamento5.
O sulfato ferroso é o composto disponível para o tratamento e prevenção da deficiência de ferro em quase todos os pacientes atendidos pelo Sistema Único de Saúde do Brasil.
- Ferro quelado
Os sais de ferro quelados são uma opção muito utilizada nos dias de hoje. Resultam da união do ferro em sua forma ferrosa (Fe2+) ou férrica (Fe3+) a um ligante orgânico, geralmente os aminoácidos.
A molécula resultante é um metal quelado e que apresenta maior resistência tanto à ação de enzimas e proteínas da digestão quanto às substâncias naturais presentes nos alimentos, como os fitatos e folatos4.
Além disso, há redução da exposição direta das células da mucosa gastrointestinal a este metal, o que poderia reduzir os efeitos adversos e a toxicidade local5.
As substâncias mais utilizadas nesta ligação são os aminoácidos. Entre eles, a glicina tem destaque como ligante e o ferro bisglicinato como preparação final.
Ao comparar a tolerabilidade entre o sulfato ferroso e o ferro bisglicinato, ambos apresentaram eficácia semelhante em doses equivalentes (50 mg de ferro elementar), porém, a frequência de efeitos adversos foi de 37% no grupo com sulfato ferroso e de 21% no grupo com o ferro quelado5.
Apesar dos benefícios potenciais, as evidências científicas ainda não demonstraram de forma significativa que o ferro quelado seja de fato superior aos sais de ferro4.
- Ferripolimaltose
A ferripolimaltose é formada por um complexo de hidróxido de ferro férrico e polimaltose5. Uma vantagem da ferripolimaltose em relação aos sais ferrosos é que este complexo pode ser administrado durante ou após a refeição, pois sua absorção não sofre influência dos alimentos.
Além disso, esta forma de ferro possui menor incidência de efeitos adversos, proporcionando maior adesão ao tratamento e, consequentemente, melhores resultados.
Em um estudo realizado, observaram-se taxas de efeitos adversos de 44,7% com sulfato ferroso e de 17,5% com ferripolimaltose. Dos pacientes que descontinuaram o tratamento, a principal causa foi a náusea, que ocorreu em 3% daqueles em uso de ferripolimaltose e em 19% dos pacientes recebendo sulfato ferroso5.
De acordo com as evidências, a ferripolimaltose traz menos efeitos adversos quando comparada ao sulfato ferroso e reduz a baixa adesão ao tratamento, sendo uma opção de escolha relevante.
- Ferro lipossomal
O suplemento de ferro lipossomal representa um avanço significativo no tratamento da deficiência de ferro e anemia ferropriva. Oferece vantagens, principalmente em relação à tolerabilidade, em comparação às formulações tradicionais, como o sulfato ferroso.
A sua estrutura encapsula a molécula de ferro em lipossomas, micropartículas que possuem uma bicamada lipídica que protege o mineral da degradação ácida no estômago e da interação com inibidores da absorção (fitatos, polifenóis), permitindo que partículas intactas alcancem o duodeno e o jejuno proximal, locais primários de absorção de ferro6.
Há menor exposição do ferro livre à mucosa gástrica, reduzindo os efeitos adversos. Estudos indicam uma redução de 60 a 70% na incidência de náuseas, dor epigástrica e constipação com ferro lipossomal versus os sais ferrosos. Em gestantes, a taxa de efeitos adversos foi 12% com o ferro lipossomal (14 a 28 mg/dia) contra 35 a 40% com o sulfato ferroso7.
Efeitos adversos da suplementação
Os efeitos adversos mais comuns são os gastrointestinais, tais como náuseas e vômitos, constipação ou diarreia, flatulência, sabor metálico, manchas nos dentes e desconforto epigástrico1-4.
Como estes efeitos parecem ser dose-dependentes4, o fracionamento da dose ao longo do dia parece ser uma estratégia interessante para minimizá-los.
Além disso, consumir o suplemento junto às refeições, apesar de poder atrapalhar na absorção, pode ser uma estratégia interessante pensando na redução do desconforto e maior adesão ao tratamento, sendo importante avaliar caso a caso com o paciente.
Estratégias de administração
A absorção dos suplementos de ferro, com a possível exceção do ferro quelado, é prejudicada pela presença de fitatos, polifenóis e proteína de soja. Além disso, medicações que reduzem o pH gástrico podem inibir a absorção das formas mais comuns de ferro4.
Para auxiliar a absorção do suplemento de ferro, algumas orientações devem ser feitas aos pacientes:
- Para pacientes onívoros: consumir o suplemento de ferro junto a um alimento fonte de proteína animal (carnes) pode facilitar a absorção.
- Consumir fontes de vitamina C junto ao suplemento, devido ao potencial auxílio à absorção.
- Evitar o consumo de café, chás, leite e derivados próximo ao horário de suplementação.
Há evidências de que a suplementação de ferro em dias alternados pode ser uma boa estratégia. Além de otimizar a absorção, também pode auxiliar a reduzir os possíveis efeitos adversos8.
O sulfato ferroso é considerado a primeira linha de tratamento para a maioria dos casos de anemia ferropriva, devido à sua eficácia e baixo custo. Entretanto, em pacientes com intolerância gastrointestinal ou outras condições específicas, outras formas de ferro podem ser consideradas1.
Uma vez que ainda não há um consenso estabelecido em literatura em relação ao melhor formato de suplemento de ferro, o ideal é sempre avaliar individualmente as necessidades de cada paciente.
De modo geral, a escolha do tipo de suplemento de ferro deve considerar a biodisponibilidade, tolerabilidade e custo. A individualização é essencial para otimizar os resultados e garantir a adesão ao tratamento.
--> Leia também: Como otimizar o consumo de ferro no atendimento a vegetarianos?
Referências Bibliográficas
[1] Ministério da Saúde. Protocolos e Diretrizes - Relatório de Recomendação. Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas - Anemia por Deficiência de Ferro. 2023. Disponível em: https://www.gov.br/conitec/pt-br/midias/consultas/relatorios/2023/relatorio-tecnico-pcdt-anemia-por-deficiencia-de-ferro
[2] WHO, UNICEF. UNU. Iron Deficiency Anaemia: Assessment, Prevention and Control. Organisation. WH, editor. A guide for programme managers: Geneva; 2001. 114 pp.
[3] Ministério da Saúde. Programa Nacional de Suplementação de Ferro. Manual de Condutas Gerais. 2013. 24 p.
[4] Lo JO, Benson AE, Martens KL, Hedges MA, McMurry HS, DeLoughery T, Aslan JE, Shatzel JJ. The role of oral iron in the treatment of adults with iron deficiency. Eur J Haematol. 2023 Feb;110(2):123-130.
[5] Cançado R, Lobo C, Friedrich J. Tratamento da anemia ferropriva com ferro por via oral. Rev Bras Hematol Hemoter. 2010;32.
[6] Hussain U, Zia K, Iqbal R, Saeed M, Ashraf N. Efficacy of a Novel Food Supplement (Ferfer®) Containing Microencapsulated Iron in Liposomal Form in Female Iron Deficiency Anemia. Cureus. 2019 May 7;11(5):e4603.
[7] Parisi F, Berti C, Mandò C, Martinelli A, Mazzali C, Cetin I. Effects of different regimens of iron prophylaxis on maternal iron status and pregnancy outcome: a randomized control trial. J Matern Fetal Neonatal Med. 2017 Aug;30(15):1787-1792.
[8] Siebenthal HK, Gessler S, Vallelian F, Steinwendner J, Kuenzi UM, Moretti D, et al. Alternate day versus consecutive day oral iron supplementation in iron-depleted women: a randomized double-blind placebo-controlled study. EClinicalMedicine. 2023 Nov 1;65:102286–6.

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Texto produzido por fontes especializadas, e publicado pela Piracanjuba com fins informativos.
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